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Raridade (e uma vindicação da futilidade, em dois tempos)

E não é que apareceu um template bacaninha? Quem diria. Mudei correndo.

* * *

Eu ia escrever um texto explicando por que a futilidade é 1) irrespondível, e 2) muito humilde. Ia, mas meus maridos não me sustentam para que eu quebre as unhas digitando coisas enormes e, pior, meio filosóficas. De modo que vou ser rápida.

A futilidade é irrespondível porque é deliciosamente arbitrária. Digamos, por exemplo, que você tenha o mau gosto e a falta de tato de me convidar para ver um filme do Almodóvar, e eu, que no fundo até vou com a sua cara mas estou morrendo de preguiça de lhe explicar tudo o que Almodóvar tem de medíocre, canalha e filisteu, digo que não vou, porque não assisto filmes de diretores espanhóis feios e cheios de frieiras. Eu nem sei se ele tem mesmo um monte de frieiras, mas daquela cara se espera tudo, então pronto, digo isso mesmo: cheio de frieiras.

O que você pode responder? Que ele não é feio, nem tem frieiras? Mas ele é feio, e você também não sabe se ele tem frieiras ou não (e nem tem coragem de dizer que não, ele não tem frieira nenhuma). Que não há relação comprovada entre espanholidade, feiúra, frieiras e mau cinema? Mas eu acho que há. Na verdade nem acho: sei que há. E sei porque sei. Você não tem resposta, e eu sinceramente nem preciso me justificar: não preciso ter nenhum motivo racional ou válido para sustentar a minha idéia geral dos diretores espanhóis, feios e cheios de frieiras. Acho isso porque acho, e ponto final. Vá ao cinema sozinho.

E a futilidade é muito humilde porque ela faz com que qualquer um se sinta melhor do que o fútil. O fútil se expõe às pedradas da indignação, do mesmo modo como um santo se expõe a levar pedrada e ser massacrado, baleado e torturado por incréus. Diante da futilidade, qualquer motivo, mesmo um bem idiota, parece excelso, invulgar, grandioso. De novo ao Almodóvar: é tão idiota não gostar dele porque é feio e cheio de frieiras que uma razão igualmente estúpida para gostar dele – digamos, a de que ele “resgata a marca do feminino” – passa imediatamente a parecer profunda, pensada, genial. Em comparação com o fútil, qualquer palhaço pomposo e metido se torna digno de atenção, e consegue diafarçar nessa grandiloqüência a sua própria futilidade. Porque gostar do resgate da marca do feminino, convenhamos, é gostar de quê afinal? É preciso muita humildade, muita abnegação da parte do fútil para legitimar tanto a banalidade geral.

Eu teria mais a dizer, mas o chocolate quente que eu fiz para enfrentar esses quinze graus vai acabar esfriando, e não tinha um poeta fumante e chato dizendo que não há mais metafísica que chocolates? Eu esquento o meu, e já sou grandinha, e com licença, fiquem bem, etc.


18 Respostas to “Raridade (e uma vindicação da futilidade, em dois tempos)”


  1. maio 11, 2008 às 1:58 pm

    a) não viaja. b) não anda por aí classificando qualquer coisa de filosofia. c)procura um filme do King e puxa a corda.

  2. maio 11, 2008 às 7:54 pm

    almodóvar nunca me enganou.

  3. maio 12, 2008 às 6:48 am

    Gostei de Hable com Ella. Não vi nenhum outro filme dele porque aqui é difícil pegar filmes estrangeiros. Falando em filme fiquei muito curiosa com o filme que se passa em Sampa, resenhado no Pensar Enlouquece de 9 de maio.

  4. maio 12, 2008 às 12:45 pm

    a bunda da penelope cruz em volver é… cativante. mas é fake, e só descobri depois de oferecer todo o meu amor em pensamento a ela. o que colocou o almodovar assim, abaixo de um mcg.

  5. 5 elisa
    maio 13, 2008 às 11:55 pm

    caramba, Silvia, esse template… tsc. parece coisa do almodovar.

  6. 6 Lucas
    maio 15, 2008 às 5:59 am

    Ou, postei num post antigo seu. Do chiquismo.

    postei num post… puts

  7. maio 17, 2008 às 1:36 pm

    ainda estou decidindo se achei interessante ou odiei teu blogue

  8. 8 c. dubreau
    maio 19, 2008 às 12:05 am

    finalmente alguém pôs em palavras (intelíveis até a entusiastas do cinema, acho) a tolice que é almodovar. faça isso com david lynch, por favor – é difícil se fazer entender pelos estereótipos universitários que insistem em se convencer que o cara é gênio.

  9. maio 19, 2008 às 2:30 pm

    A futilidade é a parte divertida do capitalismo.
    E adoro o almodovar a-d-o-r-o-! principalmente porque ele coloca umas maquiagens super carregadas nas atrizes e porque tudo é clorido igual palheta da suvinil. e é claro que ele é feio, chega de só homem bonito ser gay.

  10. 10 Inaiara
    maio 21, 2008 às 12:02 am

    Este template deixou-me à beira de um ataque de nervos! Com toda a minha humildade, aponto-o como fútil…

  11. 11 Lucas
    maio 22, 2008 às 9:14 pm

    Meu Deus! Uma mulher que não gosta de Pedro Almodóvar. Se você disser que não gosta de Clarice Lispector, eu te peço em casamento.

  12. maio 26, 2008 às 3:02 am

    Não viajo mesmo, Everton Maciel: não vou nem ao Butantã, que é aqui do lado. Nem a mim, Iracema, mas ao Caetano sim. Que sorte a sua, Tina Harris. Quem definiu Penélope Cruz muito bem foi Ford Madox Ford, Tiago, em “O bom soldado”, que lhe recomendo. Não, Elisa, faltam umas vinte cores e um midi de uma mulher gritando. É, Lucas? Não se apresse, Diego. Pode deixar, Dubreau: assim que eu criar coragem de assisti-lo. Mas é possível ser fútil no socialismo, Bia: lembra das torneiras dos banheiros do Ceausescu? E bicha feia tem que pagar, ao que me consta. Bingo, Inaiara. Se só depender disso, Lucas, pode passar na casa Suissa e encomendar as alianças.

  13. maio 28, 2008 às 9:43 pm

    almodóvar nunca me enganou².

    olá, Sílvia.

  14. 15 Ed
    junho 24, 2008 às 5:02 am

    Pensei que até que fosse um post novo, mas não: novo é o template =]

    Abraço. Apareça para um chá – ou algo mais forte, quem sabe.

  15. julho 4, 2008 às 10:10 pm

    Tenho certeza que está escrevendo. Por favor, compartilhe.

  16. julho 22, 2008 às 12:52 pm

    olha, agora que já te linquei, o mínimo que tu pode fazer é manter isso aqui atualizado pra eu não me sentir tão frustrado com a perda de tempo e desgaste físico a cada vez que clico.

    danken.


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